segunda-feira, 9 de julho de 2007

Messias? Eu?

por Marcel Bane


É melhor rezar pelos seus pecados. O profeta que anunciou a chegada do messias gay, que viria redimir a humanidade, saído de um filme pornô dos anos 70 está de volta. Depois do tímido início com o belíssimo e intimista álbum homônimo, depois de ter sido atirado à condição de messias gay ele mesmo, de ter freqüentado a lista de melhores de 2001 com o pungente poses, e de dois álbuns que exalavam uma melancolia esperançosa, want I e want II, Rufus Wainwright lançou sua quinta missiva, este Release the Stars, em maio. Filho de dois ícones do folk canadense dos anos 60, Loudon Wainwright III e Kate McGarrigle, Rufus herdou do pai a habilidade de escrever canções simples, que acertam inexoravelmente o coração, como mísseis teleguiados. Da mãe, o faro instintivo para tecer melodias delicadas ao piano, a paixão pela ópera e pela música clássica. Longe da esquizofonia que acomete artistas que tentam misturar estilos diversos em uma salada musical, que muitas vezes soa estragada, o nosso bardo chega a um denominador comum. O estilo Rufus de fazer música. E abra-se um leque bem amplo para dar conta do quão variado ele pode ser: Vaudeville, rock, jazz, orquestrações rebuscadas, folk, tudo absolutamente pop. O mundinho epecializado em imprimir rótulos em páginas vazias apressou-se em aplicar-lhe a pecha de Pop-barroco. Mas e os beatles de Sgt. Pepper, já não eram exatamente pop e barrocos? Não à toa, Release the Stars é filho legítimo de uma transa entre os Beatles de Sgt. Pepper e o Elton John de Goodbye Yellow Brick Road.


Rufus, o batista, parece ter tomado um porre de Bourbon na noite de Sansouci, contemplando belos rapazes da sacada de seu Chatêau, e vomitou um lindo álbum, sem direito à ressaca no dia seguinte. O disco abre com um direto de esquerda na mandíbula dos que o reivindicam para si. Nada mais chato que gay militante, que precisa de um porta vozes, de alguém que carregue sua bandeira para banheiros masculinos, e eventualmente para a prisão: "Do I disappoint you?", abre delicada com o piano minimalista certeiro, termina grandiloquente e é entremeada de orquestrações oníricas. Alguém no orkut disse: - querido, não acredito que exista alguém que ouça Rufus e não compreenda Inglês! – Nem é preciso.


Rufus, o mensageiro, tem mais um recado à América. Desde california, carro-chefe de poses, ele já bocejava: " ...Califórnia, tão maravilhosa que eu prefiro ficar na cama..." , cantava. Em going to a town, vislumbra uma cidade que já foi queimada e onde moram amigos desapontados, para onde ele mesmo partiu, tão logo Bush se reelegeu: "estou tão cansado de ti, América... tenho uma vida para viver, fazer meu próprio caminho para casa..." Ele se cansou da América Republicana, aquela do pescoço vermelho, que acha dois homens se beijando mais perigosos que terroristas. A América que pariu de cesário Walt Whitman, e Allan Ginsberg se perdeu, no pior dos sentidos, lá atrás, no melhor dos sentidos. Os corais dão suporte e densidade ao álbum e à potente voz de rufus, que parece seguir a cartilha Jeff Buckley de cantar com intensidade. Os piores momentos deste e dos outros álbuns ficam por conta dessa mesma voz, especialmente quando ele senta sozinho ao piano e parece que a qualquer momento vai entoar a Ave Maria das seis.


Rufus, o advogado, clama que soltem as estrelas, pois sem elas não haveria a Paramount. A velha Hollywood já não existe mais. Ué, você não sabia?


Between my legs, a melhor do disco, é um rockão estradeiro, daqueles que dá vontade de virar a chave, pisar no acelerador e esquecer que a morte existe e anda por perto. Dá vontade de derramar uma lágrima por entre as pernas, seja lá o que isso signifique. Há uma citação ao fantasma da ópera, que soa quase como uma auto-paródia. Em Rules and Regulations, uma linha de baixo simples e grudenta conduz toda a melodia, acompanhada de um moog debochado, de um sublime naipe de metais, o que já está se tornando clichê, em se falando deste álbum. Em Slideshow são eles que dão a direção. Esta, aliás, uma baladona fodida de linda.O álbum ecoa as trombetas do apocalipse, amparadas em arranjos de cordas angelicais. A mixagem primorosa, a cargo de Marius De Vries, e a produção de Neil Tenant, do Petshop boys, valorizam as cordas e os metais. O dia do julgamento será delicado. Nada a temer, e o inferno não fica muito longe. O céu está na bandeja. É só apertar o play.

Um comentário:

Unknown disse...

Marcel,
Parabéns por esta iniciativa!
Seu texto está demais!
Desejo-te sorte nesta nova empreitada...
SUCESSO!